5 Sentidos

sexta-feira, dezembro 08, 2006

Portalegre

Toada de Portalegre

Em Portalegre, cidade

Do Alto Alentejo, cercada

De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros

Morei numa casa velha,

À qual quis como se fora

Feita para eu Morar nela...


Cheia dos maus e bons cheiros

Das casas que têm história,

Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória

De antigas gentes e traças,

Cheia de sol nas vidraças

E de escuro nos recantos,

Cheia de medo e sossego,

De silêncios e de espantos,

- Quis-lhe bem como se fora

Tão feita ao gosto de outrora

Como as do meu aconchego.


(...)


Toda aberta ao sol que abrasa,

Ao frio que tosse e gela

E ao vento que anda, desanda,

E sarabanda, e ciranda

Derredor da minha casa,

Em Portalegre, cidade

Do Alto Alentejo, cercada

De serras, ventos, penhascos e sobreiros

Era uma bela varanda,

Naquela bela janela!


(...)


Ora agora,

?Que havia o vento suão

Que enche o sono de pavores,

Faz febre, esfarela os ossos,

Dói nos peitos sufocados,

E atira aos desesperados

A corda com que se enforcam

Na trave de algum desvão,

Que havia o vento suão

De se lembrar de fazer?


Em Portalegre, dizia,

Cidade onde então sofria

Coisas que terei pudor

De contar seja a quem for,

?Que havia o vento suão

De fazer,

Senão trazer Àquela

Minha Varanda

Daquela Minha Janela,

O documento maior

De que Deus

É protector Dos seus

Que mais faz sofrer?


(...)


Coisas que terei pudor

De contar seja a quem for

Me davam então tal vida

Em Portalegre; cidade

Do Alto Alentejo, cercada

De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros,

Me davam então tal vida


- Não vivida!, sim morrida

No tédio e no desespero,

No espanto e na solidão,

Que a corda dos derradeiros

Desejos dos desgraçados

Por noites do tal suão

Já varias vezes tentara

Meus dedos verdes suados...


Senão quando o amor de Deus

Ao vento que anda, desanda,

E sarabanda, e ciranda,

Confia uma sementinha

Perdida entre terra e céus,

E o vento a trás à varanda

Daquela Minha Janela

Da tal casa tôsca e bela

À qual quis como se fôra

Feita para eu morar nela!


(...)


O amor, a amizade, e quantos

Mais sonhos de oiro eu sonhara,

Bens deste mundo!, que o mundo

Me levara,

De tal maneira me tinham,

Ao fugir-me, Deixando só, nulo, vácuos, A mim que tanto esperava

Ser fiel,

E forte,

E firme,

Que não era mais que morte

A vida que então vivia,

Auto-cadáver...


(...)


E a cada raminho novo

Que a tenra acácia deitava,

Será loucura!..., mas era

Uma alegria

Na longa e negra apatia

Daquela miséria extrema

Em que vivia,

E vivera,

Como se fizera um poema,

Ou se um filho me nascera.


Poema de José Régio*


Encontrei este poema por acaso e pensei que o poderia partilhar com vocês.
Já que ainda não havia escrito nada que se referisse a esta cidade (Portalegre) aproveito este post para isso.
De alguma forma apenas temos este blog devido a esta cidade, foi ela que nos juntou, por assim dizer.
Foi nesta cidade que nos conhecemos quando entramos na universidade, é uma cidade que qualquer uma de nós jamais irá esquecer.
No início, sou sincera, não gostava muito de Portalegre mas passados 5 anos tenho de admitir que sinto saudades de lá morar, sinto saudades das serras, das casas, das pessoas, da escola, dos amigos que lá ficaram, daqueles que tal como eu foram embora, sinto saudades de tudo...
Enfim aqui fica o sentimento que tenho por este pedaço do nosso Portugal.

*O poema não se encontra completo.
posted by A.G. at 3:35 da tarde

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